quinta-feira, abril 19, 2007

"É minha satisfação"

E lá ia eu, pela avenida, atrasado para o culto novamente (aliás, isso tem se tornado habitual demais para o meu gosto). De repente, após um cruzamento vejo dois motoqueiros, que acabaram de parar, conversando.
Um deles era o típico motoboy paulistano: moto e capacete surrados da labuta diária, cheia de corridas de lá para cá; a mochila cheia também não desmentia a profissão (e além de tudo devia pesar um bocado). Numa outra moto, em melhor estado e provavelmente mais nova, estava um rapaz com terno e sem mala, aparentemente voltando do trabalho.

—Por favor— dizia ele, oferecendo algo (não consegui ver o quê), ao motoboy
—Não, não precisa.
—Por favor...— dizia o rapaz até ser interrompido pelo motoboy:
—Não, não. É minha satisfação ajudar um companheiro que precisa.

Se você não reside em São Paulo, Capital, deixe-me situá-lo: o trânsito daqui, como em toda grande cidade, é algo feroz, beirando o desumano. Se algum cientista quisesse comparar o comportamento dos humanos com o dos animais selvagens, deveria ver as grandes avenidas da cidade na hora do rush para começar a questionar se Darwin estava correto ao falar em evolução da espécie humana.
No meio desta fauna, um grupo é alvo mais freqüente do ódio generalizado instituído no caótico trânsito da cidade: são os motoboys, que vez por outra passam zunindo rapidamente pelos carros ou se esgueiram entre eles e os ônibus nos engarrafamentos e, como às vezes abusam demais, acabam se envolvendo em vários acidentes.
E é nos acidentes que se vê outro diferencial deste grupo da selva de concreto: se um cai, seja por quaisquer problemas, logo ao menos dois outros param para ver se está tudo bem e ajudar quando necessário. E isso vem antes mesmo de haver uma entidade que os organizasse como categoria. Enfim: sempre foram solidários.

A frase do motoboy naquele dia me acertou em cheio: mesmo aparentemente não tendo nada a oferecer, ele ajudou de alguma forma o outro motoqueiro, que aparentava uma condição social melhor, sem pedir nada em troca. Tudo o que ele ganhou (fora um "muito obrigado", claro) foi a satisfação de ajudar um companheiro necessitado.

É sempre bom lembrar que neste mundo nós, cristãos, é que somos os motoboys da história, nos esgueirando entre inimigos, que tentam nos "fechar" e esmagar com seus grandes carros e ônibus cheios de maldade. Assim como os verdadiros motoboys, devemos atentos para os companheiros que caem para reerguê-los e ajudá-los a voltar para as avenidas da vida e chegar ao destino.

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